sábado, 29 de fevereiro de 2020

DEL REY - UM BREVE HISTÓRICO E VERSÕES INUSITADAS


Diversas foram as razões de a Ford do Brasil ter lançado o luxuoso Del Rey no Brasil, em 1981.
O sucesso do Corcel II, lançado 3 anos antes, apressou o fim do Maverick, sedan médio que estreou em 1973 apenas com nada econômicos motores de 6 e 8 cilindros. O de 6 cilindros era o velho motor usado no antigo Itamaraty (Willys)!
As sucessivas crises mundiais do petróleo e a "surra" do rival Chevrolet Opala fizeram as vendas do Maverick despencarem, e nem a versão 4 cilindros, lançada tardiamente em 1975, conseguiu reerguer o carro. 
As crises do petróleo encalharam as vendas de carros grandes e gastadores em todo o mundo, e aqui condenaram à extinção a linha Landau e Dodge V8.
Carente de recursos, a Ford precisava de um novo carro que substituísse o Maverick (retirado de linha em 1979, sem sucessor) e, de quebra, oferecesse o luxo e a exclusividade presentes no quase finado Landau.
Assim, a partir do Corcel II a Ford preparou não um "Corcel III" e sim um sedan com porta-malas destacado e com opção de 2 ou 4 portas.
Em prol da economia, o novo sedan iria se valer do mesmo motor 1.6 do Corcel, com 69 cv e velocidade máxima de 137 Km/h. Números nada empolgantes, mas o antigo propulsor oferecia bom torque na cidade e - o principal - era bem econômico). Para conter custos, a plataforma utilizada pelo Del Rey seria a mesma do Corcel II.
Dois erros foram cometidos logo de cara: para um carro de luxo "de verdade", a distância entre-eixos deveria ter sido aumentada para oferecer mais conforto para os passageiros do banco de trás.
Da mesma forma, deveria ter sido utilizado um motor mais potente e moderno - no caso, a Ford dispunha do moderno 2.3, 4 cilindros, que estreou no Maverick em 1975 e depois foi utilizado na Rural, F75 e Jeep (e exportado durante anos).
Então, apesar do espaço interno acanhado e do motor "com potência apenas suficiente", o Del Rey cobria o dono de mimos e oferecia rodar suave. 
O acabamento esmerado era o típico da Ford daqueles anos, e havia itens de conforto e conveniência nunca antes oferecido pela Ford, como rodas de liga-leve, faróis de neblina, cintos de segurança retráteis, vidros com acionamento elétrico e travas elétricas, por exemplo. 
Uma das marcas registradas do Del Rey e muito apreciada pelo consumidor era o console no teto, com luzes de leitura e um charmosos relógio digital com função de cronômetro, envolvidos por um irresistível mostrador na cor azul. O painel de instrumentos era completo e novamente uma referência no segmento. 
Naqueles difíceis anos 80, de crédito escasso, alta inflação e poucos investimentos na indústria automobilística (ainda era proibido importar carros de passeio), até que o Del Rey foi bem sucedido.
A opção de 2 portas pode soar estranho em se tratando em um carro de luxo, onde o dono se senta no banco de trás... mas o brasileiro tinha o estranho hábito de preferir carros com essa configuração. Já a versão 4 portas facilitava o acesso ao banco de trás, mas era mais "careta" e talvez deixasse evidente que o espaço na parte de trás da cabine era menos generoso que o esperado.
O câmbio automático era opcional e foi disponibilizado em 1983 e em 1984 o modelo ganhou o motor CHT 1.6, evolução do anterior e adotado no recém-lançado Escort.
Em 1983 a Ford lançou a perua Scala Del Rey - uma Belina com o mesmo acabamento e conforto do sedan Del Rey. 
Mas ela não convenceu o mercado cada vez mais exigente. 
Pra começo de conversa, um carro "para a família" deveria ter quatro portas, e não apenas duas - pesadas e enormes. 
A título de comparação, a perua VW Santama Quantum (lançada em 1984) tinha quatro portas, e fez muito sucesso...
A linha Del Rey para 1986 teve um providencial "face lift" (novos faróis/piscas, grade do motor passou a ser horizontal e na cor da carroceria, lanternas traseiras caneladas e outros aperfeiçoamentos). A direção hidráulica finalmente passou a ser item de série. 
Nesse mesmo ano surgiu a cara - e cobiçadíssima versão Ghia (topo de linha).
No fim dos anos 80, a fusão da Ford e da Volkswagen na malsucedida Autolatina, permitiu ao Del Rey receber um motor à altura, o conhecido AP 1.8 (95 cv) da Volkswagen, que proporcionou mais agilidade ao sedan, sem consumir muito mais. 
O lançamento do Verona e do Apollo (versões sedan do Escort) decretaram o fim da linha Del Rey já em 1991, após 350.000 unidades produzidas.
VERSÕES ARTESANAIS
Na década em que o Del Rey esteve presente no mercado, não faltaram opções artesanais que davam ainda mais exclusividade ao veículo.
A versão conversível era mesmo "de virar a cabeça". Deixava o carro muito esportivo e, ao mesmo tempo, elegante... desde que não se levantasse a capota de nylon. 
A Santo Amaro e a Souza Ramos foram algumas concessionárias da marca que produziram essa versão, até hoje atraente.
LIMOUSINE DEL REY
Já a versão limousine, com diferentes "enxertos" na carroceria, finalmente ofereciam o espaço extra que sempre faltou ao Del Rey e que agora permitiam a livre movimentação das pernas dos afortunados passageiros do banco de trás, bem como o acesso ao interior do carro. Quanto ao design... o resultado é bastante polêmico. 
 
 
Acima e abaixo: a Engerauto, a Santo Amaro e a Souza Ramos produziram algumas unidades, mas em razão do preço elevado e resultado estético discutível (além do motor fraco), não fizeram o sucesso esperado. 
 
 
 

Por fim, sempre tem algum "mechânico" de fundo-de-quintal que solta a imaginação e cria algumas versões bizarras, como picape e alguns xunados que nem merecem muitos comentários.

sábado, 1 de fevereiro de 2020

SIMCA DO BRASIL - PARTE1

A sigla SIMCA originalmente significa Société Industrielle de Mécanique et Carrosserie Automobile - era uma fábrica de automóveis francesa fundada em Nanterre, em 1935, pelo empresário italiano Enrico Pigozzi.
No começo da década de 50 a Simca havia escolhido o Brasil para ser a filial americana, e a idéia inicial era produzir em conjunto com a FIAT (que forneceria um novo motor, em substituição Ford Aquilllon, de 1932). Essa fábrica seria instalada na cidade de Santa Luzia/MG. 
Com o suicídio de Vargas, em 1954, a Fiat desistiu do projeto. 
Como o Plano de Metas de JK previa a instalação de uma indústria automobilística nacional, a Simca retomou o projeto.
1958 - A filial brasileira foi fundada em 5 de maio de 1958 e, aqui, a sigla SIMCA passou a significar Sociedade Industrial de Motores, Caminhões e Automóveis.
Ela ocupou as antigas instalações da Brasmotor (que montava carros americanos da marca Chrysler), situada no Km 23 da Via Anchieta, defronte à fábrica da Volkswagen.

O modelo escolhido para ser produzido aqui (CHAMBORD) era muito semelhante ao Simca francês VEDETTE.
Vide abaixo um dos primeiros modelos aqui vendido.

1959 - Após vários testes com 47 "Vedettes" franceses, é iniciada em 7 de março a produção do CHAMBORD no Brasil, com baixíssimo nível de nacionalização. 
Na verdade os carros não foram produzidos aqui; vieram da França, completamente desmontados, sendo suas peças reunidas a algumas poucas aqui produzidas, como bateria, molas, tapeçaria, sistema de escapamento, mangueiras e outros pequenos itens. 
Para se ter uma ideia, na soleira das portas vinha inscrita a palavra VEDETTE e não CHAMBORD... De qualquer forma, ele impactou o mercado de forma muito positiva. Medindo 4,75m de comprimento, era um elegante sedan com linhas tipicamente norte-americanas (rabo-de-peixe), 4 portas e capacidade para até 6 pessoas, com porta-malas igualmente amplo.
O motor Aquilon, apesar de V8, fora concebido na década de 30 e rendia apenas 88 cavalos. O câmbio tinha 3 marchas (a 1ª não era sincronizada), com alavanca na coluna de direção. Até que não era um carro tão “gastão” (fazia média de 8 Km/l), mas a velocidade máxima era bem modesta: 135 km/h, embora compatível com o calçamento precários das ruas e estradas da época. 
A suspensão dianteira (McPherson) deixava o carro bem estável e absorvia bem as irregularidades do piso. Na época de seu lançamento não encontrou concorrentes, pois somente outros 6 veículos nacionais eram produzidos: a Romi-Isetta, a perua DKW, os VW Fusca e Kombi, além dos utilitários Jeep e Rural, da Willys – todos de segmentos inferiores. Mas o lançamento “precipitado” acarretou uma série de problemas, como a facilidade de superaquecimento do motor, a embreagem fraca (patinava constantemente) e a falta de torque, especialmente em baixas rotações.
1960 – Em 16 de abril foi produzido o 2.000º exemplar e, em homenagem à futura nova capital do país, foi pintado em duas cores: verde folha e marfim. 
A fundição dos motores nacionais teve início em 30 de agosto. Nesse ano a Willys lançou o Aero e a FNM começou a produzir o JK, o que obrigou a Simca a resolver depressa os problemas de seu belo automóvel. 
Assim, em setembro foi lançada uma nova versão, topo de linha, denominada PRÉSIDENCE.
A maior diferença de estilo do PRÉSIDENCE em relação ao CHAMBORD, era o “estepe continental” (preso do lado de for, na tampa do porta-malas). 
Internamente, destacavam-se os bancos de couro, ar condicionado, luzes de leitura para os passageiros, rádio de longo alcance e até bar com copos de cristal no compartimento dos passageiros. O motor, com dois carburadores de corpo duplo e uma taxa de compressão maior, rendia 94 cavalos.

1961 – Em abril foi lançada a “Segunda Série” do CHAMBORD, com índice de nacionalização próximo de 90%. 
Foram adotados novos frisos laterais e um emblema em forma e andorinha, montado em ambos os pára-lamas dianteiros. 
Em outubro as calotas raiadas foram substituídas pelo estilo “turbina”, com imitação de “cubo rápido”. Nesse mês foi lançada a linha 1962.
1962 – Em abril foi lançada a série “Três Andorinhas”. Os motores sofreram aumento de potência (95 cavalos, no CHAMBORD e 105 no PRESIDENCE).  
 
Em meados desse ano surgiu uma versão esportiva, denominada RALLYE ESPECIAL, que mesclava esportividade e luxo. 
Duas tomadas de ar, redondas e semelhantes às do norte-americano Chevrolet 1957, foram acrescentadas no capô do motor.
O interior era mais esportivo, mas externamente o carro ganhou apenas duas entradas de ar no capô (para melhor ventilação, dizia-se), carburação e escapamento duplos, vidros verdes e alguns detalhes cromados.  Utilizava o mesmo motor do Presidence, com 105 cavalos. 
 
Confira abaixo o RALLYE e suas evoluções de estilo até 1966.
 
 
Em novembro de 1962, no III Salão do Automóvel, a família continuou aumentando e foi apresentada a primeira station wagon brasileira, a JANGADA, derivada da perua francesa Vedette Marly, nas versões Luxo e Utilitário. Ela quase foi batizada de BANDEIRANTE, mas prevaleceu o nome JANGADA - embarcação rústica mas resistente, sendo que a perua era luxuosa, mas frágil... Apesar de oferecer o mesmo conforto do CHAMBORD (o motor rendia 98 cavalos, mas era mais pesada). 
 
 
Em compensação, em trajetos mais curtos, a Jangada podia transportar até 8 pessoas, graças aos dois assentos laterais (escamoteáveis) localizados no porta-malas. Bastava levantar a tampa que cobria o estepe, e, após a retirada do pneu, havia espaço para dois banquinhos (mas aí o estepe teria que ir para o teto do veículo...). Os bancos traseiros, por sua vez, podiam ser completamente rebaixados, formando uma ampla plataforma de carga com capacidade para 1.800 litros de bagagem. Mas a carroceria tinha pouca resistência à torção e era comum ver alguns exemplares do interior do país com as portas traseiras amarradas com pano ou cordas à coluna. A parte elétrica era uma fonte de dor de cabeça e o motor costumava superaquecer.
1963 – A Willys redesenhou totalmente o AERO, deixando-o mais requintado e moderno. O FNM 2000 JK também conquistava fatias do mercado.
Na tentativa de oferecer à classe média brasileira um carro de preço mais acessível, a Simca lançou o modelo “popular” ALVORADA, desprovido de qualquer luxo e da maioria dos cromados presentes nos demais modelos. Esta nova versão foi um fiasco (assim como o Willys Teimoso e o DKW Pracinha), razão pela qual o modelo logo saiu de linha com apenas 378 unidades produzidas. 
 
O popular ALVORADA - clique nas imagens abaixo para ampliá-las.

1964 – A “Primeira Série” era idêntica à linha 1963, mas a “Segunda Série” trouxe a linha TUFÃO, com mudanças de ordem mecânica e estética. O pára-brisa ficou mais amplo, melhorando a visibilidade dianteira. O teto do sedan e as colunas ganharam linhas retas e a parte traseira foi elevada, oferecendo maior área envidraçada e mais espaço para os passageiros. Internamente, mais conforto e luxo, além de novos bancos. As lanternas traseiras foram redesenhadas (nova disposição de luzes, com o mesmo formato) e o modelo recebeu novos frisos.  
Os motores V8 Tufão tinham 2.414 cc (100 cavalos) e o Tufão Super, de 2.550 cc (112 cavalos e dupla carburação, onde  um carburador abria depois do outro, conforme a necessidade, durante a marcha). A linha Tufão ganhou avanço manual da ignição, localizado no painel (além do automático), que permitia melhor regulagem do motor para diferentes altitudes ou diferentes tipos de gasolina.
Nesse mesmo ano surgiu o RALLYE (mais simples que o RALLYE ESPECIAL, embora mais sofisticado que o CHAMBORD).
A perua JANGADA perdeu a versão utilitário, permanecendo apenas a Luxo.
1965 – Nesse ano a versão ALVORADA deu lugar à PROFISSIONAL, numa tentativa de seduzir frotistas e taxistas - fotos abaixo.
 
Abaixo, o PROFISSIONAL - para taxistas.

Ainda em 1965, a perua JANGADA ganhou o mesmo teto retilíneo e o pára-brisa da linha sedan Tufão. 
Introduziu-se em todos os modelos a ignição transistorizada e o sistema 6-M (sobre-marcha eletro-mecânica) que multiplicava as três marchas originais por dois (opcional do RALLYE ESPECIAL e do PRESIDENCE – este também recebeu um vidro separando os passageiros do motorista).  Posteriormente o CHAMBORD também recebeu dupla carburação.
1966 - a Simca enfrentava a concorrência implacável do bonito e confiável AERO WILLYS 2600 (redesenhado em 1965), do elegante e exclusivo FNM 2000 (JK) e sabia que a Ford preparava o lançamento do . A Willys, por sua vez, lançaria nesse ano uma versão mais luxuosa do Aero, com o nome ITAMARATY.
Assim, em abril de 1966 a Simca deu um expressivo salto de qualidade ao adotar um novo motor em toda a linha: o EMI-SUL – um 8 cilindros em “V” com cabeçote de alumínio (que alojavam as válvulas), câmaras de combustão hemisféricas, novos coletores de admissão e escapamento e 2.410 cc e potência bem mais elevada (130 cavalos).
Esse novo motor permitia acelerar de 0 a 100 Km/h em apenas 14,3 segundos e a velocidade máxima atingia expressivos 160 Km/h. 
 
No V Salão do Automóvel de 1966 foi apresentada a linha 1967, constituída apenas pelo CHAMBORD e pela perua JANGADA. 
Em consequência, os modelos PRESIDENCE, RALLYE, RALLYE ESPECIAL e PROFISSIONAL deixaram de ser produzidos. 

A perua JANGADA modelo 1967 (foto ao lado) - última a ser produzida - ganhou uma nova coluna traseira, mais larga, que lhe deu maior rigidez estrutural e um aspecto mais robusto.
Graças às novas colunas, a tampa traseira pôde ser recuada até o nível dos para-choques, proporcionando ainda mais espaço ao já amplo porta-malas.
Os banquinhos-extras, que antes ficavam presos nas laterais, passaram a ser embutidos na tampa do assoalho (a exemplo de alguns modelos norte-americanos da época). 
As portas e os pára-lamas traseiros perderam o vinco característico, em baixo relevo. Ficaram planas e arrematas por um discreto friso horizontal.
 

 
 
Já o derradeiro CHAMBORD modelo 1967 ganhou frisos retos nos para-lamas traseiros e, exemplo da Jangada, perdeu o tradicional estampo em baixo relevo nas portas traseiras, que se estendiam até o para-lamas. 
A tampa do porta-malas também perdeu o desenho em baixo relevo e recebeu um discreto friso cromado interrompido apenas pelo discreto botão da fechadura do porta-malas.
Foi o "canto do cisne" para o elegante sedan que aqui estreou em 1959.

Continua...